Pensando em fazer um negócio da China? Talvez seja útil saber que os milhões de potenciais consumidores chineses não usam forno. Nem agenda ou tampouco banheira. E jamais os chame pelo primeiro nome – essa intimidade é permitida apenas aos familiares.
As informações, que podem parecer saídas de um almanaque, foram coletadas pelo antropólogo francês Dominique Desjeux, da Universidade de Sorbonne. Especialista em comportamento do consumidor, Desjeux criou um método de pesquisa qualitativa dos hábitos de consumo nas mais diversas culturas, como a africana e a asiática, que ele estuda há mais de dez anos.
Em tempos de internacionalização crescente das empresas para economias de países emergentes – como os asiáticos – essas ferramentas do que ele chama de etnomarketing vêm cada vez mais sendo requisitadas pelas empresas.
O “método de itinerários”, aplicado por Desjeux, consiste em acompanhar o consumidor de bem perto, desde antes da decisão de compra até a hora do descarte. Para empreender essa tarefa de “detetive de consumidor”, a equipe de pesquisadores frequenta até os espaços mais íntimos da casa, como banheiro e quartos, onde tudo é documentado por meio de entrevistas e fotografias.
Composto de sete etapas, o “detetive” acompanha o consumidor na lista de compras, no deslocamento para a loja, na hora de guardar os produtos, de como estes vão ser usados até o momento de se desfazer do bem.
“É preciso entender como as pessoas se relacionam com as coisas e com si próprias, seus problemas concretos da vida cotidiana”, disse Desjeux, que esteve no Brasil nesta semana para participar da I Cátedra L’Oréal de comportamento do consumidor, na Coppead UFRJ.
O pesquisador francês disse que é corriqueiro pesquisas apontarem a preferência maciça por determinado produto e quando este é lançado só 10% das vendas esperadas ocorrem de fato. “Há diferença entre o que as pessoas pensam, dizem e fazem, e os questionários não conseguem capturar isso.”
Segundo Desjeux, a pesquisa puramente quantitativa é muito útil, mas não consegue revelar alguns detalhes que podem tanto atrapalhar quanto determinar o sucesso de um produto.
“Há uma série de fatores que influenciam a vida cotidiana das pessoas. São aspectos religiosos, culturais, familiares”, observa o professor que dá aulas na Sorbonne, em Paris.
Desjeux, que vem pesquisando culturas absolutamente distintas, como a francesa, a africana, a escandinava e a chinesa, diz que esse tipo de consultoria vem sendo mais procurado pelas empresas. “Percebo isso pelo número de contratos que fechamos, que vem crescendo muito nos últimos anos”, disse.
Estudioso da China, onde já morou, Desjeux diz que está muito interessado nos países do bloco Bric, formado por Brasil, Rússia, Índia e China.
A ascensão econômica das economias emergentes tem fomentado o estudo de sua cultura por parte de fabricantes de bens de consumo. Estudar os hábitos desses novos clientes é importante para adaptar os produtos vendidos, até então, a países mais ricos. É justamente essa linha de pesquisa que recebeu o nome de etnomarketing.
“Costuma-se focar muito no produto e nos concorrentes, no que o consumidor quer, mas é preciso observar também quais são as limitações para aquele consumo, entraves culturais, cotidianos ou sociais. Há quem pense que a publicidade vende tudo, meu trabalho é mostrar como é a vida real, onde estão os elementos desencadeadores da compra na vida cotidiana das pessoas”, observa Desjeux.
FONTE: wwww